domingo, 27 de outubro de 2013

Vale a pena ler...

Publicação no site do Correio Braziliense: 27/10/2013

A geração cada vez mais conectada e com acesso ilimitado a informações mudou a forma de ensinar em sala de aula


“Não é fácil competir com os smartphones”, conta o professor de artes Emerson Machado. Há 18 anos, ele leciona —e confessa que a forma de dar aula, de lá para cá, mudou muito. “As aulas eram mais conservadoras, mas o mundo mudou e começou a andar mais rápido do que o que era dado em sala”, explica. Para acompanhar o ritmo e manter a atenção dos estudantes, Emerson recorre a vídeos, imagens, músicas e temas da atualidade. Tudo para tornar o dia a dia mais dinâmico.

E não à toa. Uma pesquisa global conduzida pela F-Secure, empresa que desenvolve soluções de segurança em softwares, identificou que, entre os entrevistados brasileiros, 31% confirmaram que as crianças de até 12 anos no Brasil já possuem um dispositivo móvel com conexão à internet. O trabalho foi feito com usuários de banda larga em 14 países. A Índia lidera o ranking, com 53% das crianças conectadas via smartphones, seguida pelos Estados Unidos (37%). O Brasil divide com a Espanha a terceira colocação (31%).

A geração cada vez mais conectada e com acesso ilimitado a informações mudou a forma de ensinar em sala de aula. Algumas escolas investem em tecnologia com lousas digitais e tablets e em novas posturas do docente, com relação “horizontal” e não tão hierárquica em relação aos estudantes.

Seja qual for o método adotado diante dessa nova realidade, uma premissa — antiga — permanece: corpo docente qualificado e com professores dinâmicos é fundamental na escolha da escola e para o futuro acadêmico do aluno.

O pesquisador norte-americano Brian Perkins é considerado um dos maiores estudiosos do impacto do clima escolar e aprendizado. Diretor do programa de liderança em educação urbana da escola de professores da Universidade de Columbia, em Nova York, Perkins realiza consultorias pelo mundo, sobretudo nas áreas de clima escolar e liderança. Em setembro deste ano, esteve no Brasil, em um seminário no Rio de Janeiro, promovido pelo Sesc — Juventudes: sujeitos e saberes em mutação .

Perkins defende que os professores devem ser motivados e dinâmicos. “A arte de ensinar é um chamado. Deve ser uma paixão e uma missão”, defende. “Não há maior esforço na terra do que transmitir informações, cultivar o conhecimento e desenvolver a sabedoria de uma pessoa jovem. Cada estudante chega com a capacidade de aprender e os professores devem ter o vigor e o comprometimento de fazer com que eles o façam em sua capacidade total.”, acrescenta.

O pesquisador afirma que docentes desmotivados resultam em estudantes igualmente desanimados. Para ele, muito da equação de sucesso acadêmico pode ser atribuído às expectativas definidas no ambiente de aprendizado. “Geralmente professores desmotivados não têm altas expectativas para eles ou qualquer outra pessoa, incluindo os estudantes. Sem altas expectativas e instruções de qualidade, sucesso acadêmico e o progresso sofrem”, avalia.

O diretor explica que alunos entram no mundo preparados para aprender. Nos primeiros 6 anos, aprendem muito do que vão saber para suas vidas. Adquirem capacidade de pensamento analítico e crítico, além da linguagem e de conceitos de matemática. Desenvolvem também discernimento estético e preferências.

Perkins explica ainda que, para alguns alunos pequenos, pouco após ingressar na escola, o entusiasmo já some e eles ficam desmotivados. “Isso não é responsabilidade unicamente da instituição de ensino, mas de um mix de ênfases inapropriadas, mensagens conflitantes, situações desencorajantes. O desafio de cada professor, de cada comunidade de ensino e pai é achar o interruptor que liga a criança no modo `on´ para aprender ”, diz.


“Sem altas expectativas e instruções de qualidade, sucesso acadêmico e progresso sofrem”
Brian Perkins, sobre motivação dos professores e ambiente de aprendizagem


Soluções
A motivação vem de uma comunidade de suporte e encorajamento. Alguns estudantes terão sucesso independentemente das condições. Mas, para passar de uma história ocasional de sucesso para uma regra geral, existe um requerimento, segundo Perkins, de membros da escola fazerem aquilo que for necessário para inspirar a criança a participar inteiramente do processo de aprendizagem.

Perkins acredita que os motivos para desânimo dos professores não são diferentes dos de outras profissões: baixos salários e condições difíceis de ensino. Para ele, a melhor forma de lidar com essa situação é abordar suas preocupações centrais. Enquanto isso não é feito, em um ou dois anos é possível tomar passos para lidar com problemas de pagamentos e de condições de trabalho. “É preciso discutir com eles a causa da falta de ânimo e cooperativamente desenvolver um plano que os mova em direção oposta”, conclui.

Exemplos
A maioria das instituições focam nesse objetivo e investem no corpo docente. É o caso de uma escola da Asa Sul, onde os professores fazem a diferença. O professor de inglês Nei Vieira leciona desde 1981. De lá para cá, admite que muita coisa mudou. “A aula dinâmica era a que levava um gravador para cantar ou violão e colocava letras dos Beatles”, lembra.

“Hoje, com essa tecnologia, minhas aulas mudaram. Ao trabalhar vocabulário, por exemplo, já entro na internet, num jornal ou revista, e trabalho com a notícia. Trabalho o tema em paralelo com o que cai no vestibular e, ao mesmo tempo, busco melhorar o vocabulário e a interpretação de texto”, acrescenta.

O professor Nei acredita que a faixa etária com a qual trabalha, entre 10 e 14 anos, é de suma importância — na qual é preciso criar gosto pelo estudo para não entrar no ensino médio com grandes obstáculos. “Temos que proporcionar a vontade para que o aluno seja construtor de seu conhecimento”. No caso dele, o sucesso tem sido dar autonomia com responsabilidade.

Outro professor benquisto nas turmas de adolescentes e pré-adolescentes é Pedro Galas, de literatura. “Eu tento me colocar no nível deles, adequar minha linguagem e sempre ponho brincadeiras e curiosidades na aula. Já tem muita dispersão naturalmente”, brinca. E a fórmula tem dado certo. A aluna Isabela Castro Ávila, 13 anos, pretende ser engenheira civil e conta que Pedro Galas consegue manter a atenção da turma e fazê-la se interessar pelo conteúdo passado. “A aula dele é dinâmica pelo jeito de falar, das gírias. Acho que tudo isso nos ajuda na hora de lembrar do material e nos interessar mais pelas aulas”, conta.

Diante de um mundo que começou a andar mais rápido que o conteúdo dado em sala de aula, o professor de artes de um colégio de Taguatinga Emerson Machado também se desdobra e traz assuntos atuais para a sala de aula. “Os alunos gostam muito da história dos artistas e das obras. Por mais que pareça algo estático, sempre é possível agregar algo novo ”, diz.

Emerson confessa que o maior desafio é manter a atenção dos estudantes. “O mundo é muito mais interessante e você tem que ser mais interessante que a internet, que o Facebook”, brinca. A solução? Investir em aula dinâmica com vídeos, imagens, música e questões atualidade e da realidade dos adolescentes. “Também procuro criar empatia. Minha relação não é de imposição, mas de parceria. Para eu não ficar desmotivado, nem eles, crio um vínculo emocional” , revela.

Crianças e smartphones no mundo
» 31%, — total de crianças de até 12 anos no Brasil que já têm smartphones
» 53% — número de crianças dessa idade com esse aparelhos na Índia
» 37% — quantidade de jovens até 12 anos com celulares inteligentes nos Estados Unidos
Fonte: F-Secure, 2012

Motivação e ensino

» De forma geral, professores desmotivados resultam em alunos desanimados
» Integrantes da escola devem fazer aquilo que for necessário para inspirar criança a participar inteiramente do processo de aprendizagem
» O desafio de cada professor, de cada comunidade de ensino e do pai é achar o interruptor que liga a criança no modo “on” para aprender
Fonte: Brian Perkins

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